17 jun 2020
Como se sabe, atualmente, a pandemia do novo coronavírus – Covid-19, vem causando reflexos na área trabalhista.
Nesse contexto, uma questão que surge frequentemente é a que diz respeito à possibilidade ou não de suspensão dos acordos judiciais realizados nesse período.
Ainda que com reforço do direito material, entende-se que a resposta deve ser positiva, e a solução deve ser encontrada na própria teoria da coisa julgada, em sua perspectiva mais moderna, que tem como pressuposto uma renovada teoria da segurança jurídica.
A teoria dinâmica da coisa julgada tem como premissa a estabilidade e a continuidade jurídica e considera que a regra seja a manutenção da intangibilidade da coisa julgada, mas permite, em circunstâncias excepcionalmente imprevisíveis, que esse fato (modificação do julgado) venha dinamicamente ocorrer.
Observa-se, assim, que há, na própria teoria da coisa julgada, uma outra perspectiva de discussão, que diz respeito à cadeia argumentativa utilizada no processo, especialmente no momento da celebração do acordo judicial.
Se o argumento não fere as legítimas expectativas dos pactuantes, não há que se falar em arbitrariedade quanto à revisão ou à suspensão de eficácia da coisa julgada decorrente do acordo homologado judicialmente.
Não se trata de uma mera análise inadequada do mercado e da dinâmica da economia do país e do mundo. Em outros termos, não se trata de uma mera “crise econômica”, que são cíclicas e inerentes ao regime capitalista.
Pelo contrário, para a maior parte do mundo empresarial, a pandemia do novo coronavírus apresenta-se como um fato histórico absolutamente imprevisível, um genuíno exemplo de força maior enquanto evento invencível e inevitável. Algumas empresas estão simplesmente impossibilitadas de funcionar, e esse fato não pode ser desprezado pelo Poder Judiciário.
A decisão judicial só mantém sua eficácia, enquanto subsista a realidade que a regula, e essa lição deve ser aplicada aos acordos trabalhistas. Embora a proteção da confiança e a proibição de arbitrariedade sejam inerentes à segurança jurídica, é certo que o abalo desta é tolerado pelo Direito diante de fatos supervenientes absolutamente imprevisíveis, como a situação atual de pandemia.
Por outro lado, no caso da suspensão do acordo, que pode ocorrer por mero incidente processual, observa-se que não há ofensa frontal à coisa julgada, pois a obrigação, em si, inclusive quanto ao valor estipulado, permanecerá intacta, o que eventualmente pode mudar é o prazo de pagamento.
A regra é a manutenção do pactuado, o respeito à coisa julgada, por uma questão de segurança jurídica, mas, comprovada a gravidade da situação para a parte reclamada, diante da impossibilidade de produzir neste momento e, por consequência, de honrar com os seus compromissos, é possível julgar procedente o pedido de suspensão do acordo.
Cabe ainda à Justiça do Trabalho fomentar o cooperativismo e a conciliação entre as partes, se possível com a preservação dos empregos.
Sendo assim, incumbe às partes portarem-se no incidente em conformidade com o dever de boa-fé objetiva, procurando soluções intermediárias e razoáveis, movidas pela equidade e pela boa razão.
Departamento Jurídico Trabalhista
Crivelari & Padoveze Advocacia Empresarial
Jamile Castelli
OAB/SP 396.255